O deputado federal e ativista gay Jean Wyllys (PSOL-RJ) voltou a
atacar o que classifica como “fundamentalismo religioso cristão” e disse
que as igrejas evangélicas se organizaram de maneira a substituir o
Estado, comparando-as ao narcotráfico e milícias.
A fala de Wyllys foi registrada numa entrevista ao jornal do Centro
Feminista de Estudos e Assessoria (CFEMEA). O deputado federal diz que o
“fundamentalismo religioso” é uma ameaça às liberdades individuais pois
as lideranças religiosas “pegam todas as frases, recomendações e
prescrições éticas ao pé da letra, sem colocá-las dentro de uma
perspectiva histórica”.
Segundo Wyllys, a pregação cristã contra a homossexualidade é um tipo
de ameaça às liberdades individuais: “A gente pode materializar esse
fundamentalismo no Brasil, por exemplo, quando líderes religiosos tentam
negar o direito das pessoas homossexuais ao casamento, com base no
trecho do Levítico, do Antigo Testamento, que diz ‘não te deitarás com
um homem, como se fosse mulher’. Eles não levam em conta que o Levítico
era um código de ética de uma sociedade tribal e que essa exortação se
resume à homossexualidade masculina, por exemplo”.
Estado paralelo
A crítica de Jean Wyllys se estende ao campo político, no qual as
igrejas evangélicas tem aumentado sua representação, e diz que esse
crescimento se deve à legislação brasileira, que a seu ver, permitiria
uma “exploração comercial da fé”, possibilitando supostos privilégios.
“No Brasil, o fundamentalismo cristão se organizou primeiro
economicamente, graças a um dispositivo constitucional que dá imunidade
fiscal às Igrejas. Significa que, na prática, elas não pagam impostos
pela exploração comercial da fé. Depois, politicamente, elas começaram
um movimento que veio da periferia para o centro: os pastores foram se
elegendo vereadores ou elegendo vereadores indicados. Em seguida,
começaram a eleger (e se eleger) deputados estaduais e por fim,
deputados federais. Assim, foram constituindo bancadas cristãs e
religiosas nas diferentes casas legislativas”, aponta o deputado
ativista.
Jean Wyllys critica ainda os trabalhos sociais desenvolvidos pelas
igrejas, classficando-os de “assistencialismo paternalista”, e afirma
que essas ações – que a seu ver só são possíveis devido à ausência do
Estado – estariam possibilitando o surgimento de um Estado paralelo.
“Quando o Estado se ausenta desses espaços, dá lugar para que
embriões de Estado se coloquem no lugar. Daí vem o narcotráfico, as
milícias e as igrejas. Graças ao assistencialismo, as igrejas puderam se
fortalecer economicamente e se eleger. Elas se converteram numa força
política e estão tomando as estruturas públicas. E não só no
legislativo, diga-se de passagem, porque hoje já há fundamentalistas no
Judiciário, nos Executivos”, ataca Wyllys.
Bancada evangélica
O deputado minimizou a capacidade de articulação da Frente
Parlamentar Evangélica, e afirmou que os deputados ligados a igrejas
apenas se reúnem para bloquear projetos que interessam aos ativistas
gays e feministas, e aprovar propostas que resultem no enriquecimento
deles mesmos: “[A bancada evangélica] não é tão articulada como a gente
imagina. Na verdade, ela se articula para algumas questões, como os
temas relacionados às liberdades individuais, por exemplo. Ou seja,
contra a liberdade da mulher, dos homossexuais, dos usuários de drogas.
Mas, tirando essas questões, ela não é tão coesa. Eles usam a pauta das
liberdades individuais como cortina de fumaça, para encobrir seus
interesses reais, de enriquecimento privado, de fortalecimento dos seus
organismos não-governamentais privados que servem, na verdade, de
fachada pra parasitar o erário público”.
Um dos projetos apoiados pela bancada evangélica, o Estatuto do
Nascituro, uma proposta de proteção à vida e assistência a mães, foi
duramente criticada pelo parlamentar.
“O Estatuto do Nascituro é uma aberração legislativa e é
impressionante que tenha sido aprovado na Comissão de Finanças e
Tributação (CFT), onde deveria ter sido emitido um parecer técnico, com o
impacto orçamentário financeiro. Se esse impacto não está previsto nas
leis orçamentárias, o PL deveria ter sido derrubado. Mas ele foi
aprovado pelo mérito. Isso é assustador, pois atenta contra os direitos
sexuais das mulheres, ao colocar os questionáveis direitos de um zigoto
acima dos direitos de uma mulher com vida, que pensa, tem uma história,
sentimentos e expectativas. O Estatuto do Nascituro tem um cunho
machista e patriarcal”, criticou.
Segundo Jean Wyllys, a postura da bancada evangélica denota “ódio”
contra minorias, como a dos ativistas LGBT: “Os homossexuais são
difamados e vítimas de perseguição, mas não só dos líderes religiosos.
Há instituições laicas que também alimentam o ódio e partilham do
preconceito contra os homossexuais. É um grupo muito odiado e a única
maneira de reverter isso é no espaço político. Se dependesse da maioria
desse Congresso Nacional, esse espaço não existiria”, afirma.
Legalização da prostituição
O deputado Jean Wyllys é autor de um projeto que prevê a
regulamentação da prostituição como profissão no Brasil, e justifica sua
proposta como sendo uma oportunidade de combater a exploração sexual:
“O Projeto Gabriela Leite (PL 4.211/2012) se articula com a CPI de
Combate à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. Nós entendemos
que o enfrentamento da exploração sexual é muito importante, sobretudo
na época dos grandes eventos, que potencializam a exploração sexual de
adolescentes e de mulheres. A partir das audiências da CPI, nós
concluímos que só é possível fazer o enfrentamento da exploração sexual
se, também, regulamentarmos a prestação de serviços sexuais no Brasil.
Ou seja, se a gente garantir segurança jurídica às mulheres prostitutas,
e se distinguirmos a exploração sexual da prostituição”.
Wyllys não mencionou em qual passo está o projeto de lei 4.211/2012, e
quando será levado ao plenário da Câmara dos Deputados para votação.
Por Tiago Chagas, para o Gospel+