segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

No editorial d'O Liberal sobre Belém, a Maior Metrópole-Favela do Brasil: "Poder Público é omisso"

Transcrevo o editorial d'O Liberal de hoje (24). Uma peça que reforça a visão expressa aqui dias atrás sobre a tragédia cotidiana que alcança mais de milhão de belenenses. Leiam:As vozes das favelas


Metade dos habitantes da Região Metropolitana de Belém mora em favelas. São 1.131.268 pessoas residindo em condições sub-humanas.

Isso não é apenas uma quantificação. É um espanto.

Belém concentra nada menos que 89% de todos os habitantes do Estado do Pará que vivem em conglomerados tecnicamente chamados de subnormais, mas que todos conhecemos por favelas.

Isso não é apenas uma quantificação. É o reflexo do fracasso ou da inexistência de políticas públicas satisfatórias para retirar toda essa gente do que se tem por subnormalidade.

O recente levantamento divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sobre as favelas - ou aglomerados subnormais - que se espalham pelo país inteiro assusta e choca quando as quantificações dão lugar ao componente humano envolvido.

Dizer que numa favela residem 30 mil ou 50 mil pessoas não revela e assência das condições em que vivem homens, mulheres e crianças.

Dimensionar tal ou qual favela como a maior de uma cidade, do Estado ou do País não tem assim tanta importância quando se ouve o relato de um morador - um que seja - dessas coletividades.

Favelas nascem espontaneamente, mas nem tanto. Os que a procuram não o fazem tanto assim, como se pensa, de livre e espontânea vontade.

Cidadãos que optam por morar em favelas são tangidos pra lá. Procuram-nas porque não têm condições mínimas de morar em outro lugar.

Esses ajuntamentos são uma resposta real e previsível de demandas sociais que em grande parte deixam de ser superadas não propriamente por falta de esforços individuais, mas porque o Poder Público é omisso em agir concretamente para minorar situações degradantes, como é o caso do gigantesco déficit habitacional.

O resultado é o que se constata a partir dos números do IBGE: milhares, milhões de pessoas se estabelecem em favelas porque, do contrário, viveriam literalmente nas ruas, embaixo das mangueiras, das marquises, das pontes. Viveriam nos prédios - públicos ou não - abandonados.

Mas não se diga que, para esse imenso contingente populacional, morar debaixo da ponte ou da marquise é assim tão diferente do que residir numa favela.

Favelados são personagens que enfrentam os efeitos da ausência de serviços essenciais. Não contam com esgotamento sanitário, com postos de saúde, com abastecimento d’água.

Convivem com águas fétidas passando à porta ou entrando em suas habitações.

São obrigados a encarar, o dia todo, a violência de todo dia.

“A gente mora aqui porque não tem outro jeito, mas não vejo a hora de ir para um lugar melhor. Fico com muito medo que as crianças escorreguem, ou que peguem alguma doença por conta dessa água”, contou à reportagem de O LIBERAL uma moradora da Terra Firme.

“Aqui em casa, nós colocamos todo mundo pra dentro por volta de seis horas da tarde. Ninguém mais sai depois desse horário, principalmente as crianças. [...] Elas vivem presas dentro de casa, só saem pra ir à escola. A verdade é que a gente mora isolado, estamos ilhados. E, quando chove, a situação é ainda pior: as águas do canal transbordam e a casa vai pro fundo mesmo”, acrescenta outra.

“A gente dorme com medo. À noite, muitas casas são invadidas e a gente só ouve os gritos. [...] Eu nasci e me criei aqui, mas não vejo a hora de conseguirmos um lugar melhor para morar. Não podemos mais esperar pelos políticos, pois eles só vêm aqui em época de eleição ou quando sai alguma denúncia na TV”, relata moradora da baixada da Condor, outra favela de Belém.

Essas são as vozes das favelas.

São as vozes que proclamam o desalento de quem se vê agrilhoado por vários grilhões, inclusive o da demagogia eleitoreira.

São as vozes de quem se vê prisioneiro de realidades e degradações que estão muito além dos números, das quantificações.

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